13 de dezembro de 2013

A soma de toda a dor

Fiquei consternada quando soube pela Melissa que a Cecília tinha finalmente partido.
Foi consternada que li uma mensagem no FB que a mãe da Cecília escreveu para ela, depois de ela ter partido.
Assim como fico de coração apertado, quase estrangulado, sempre que vejo divulgados cada vez mais e mais casos de crianças a quem o maldito cancro decidiu "visitar"...

Porque me vem sempre à memória o rosto dum menino de cerca de três anos com quem me cruzei no IPOFG, numa das vezes que acompanhei a minha mãe aos tratamentos. O rosto dele ficou para sempre gravado na minha memória, o seu rosto de anjo, feições perfeitas, completamente careca, tentando brincar numa sala de espera da sala de análises clínicas. O que melhor recordo nele, além da sua doçura, foi a falta de brilho nos olhos, tão particular e característica numa criança daquela idade...
Nunca soube se ele conseguiu vencer ou se perdeu a batalha como a Cecília...

A imagem daquele menino pairou muitas vezes no meu pensamento depois do meu filho ter nascido. Com o historial médico da minha família e conhecendo demasiado bem a dor de ter perdido a minha mãe para o cancro de mama e depois o meu pai para um adenoma da hipófise (nome pomposo para dizer tumor), eram inúmeras as noites em que olhava para o meu filho a dormir pacificamente na sua cama de grades e pedia a Deus, aos céus, ao universo, a alguém ou mesmo a ninguém, que não me fizesse passar pela dor de perder o meu filho para essa maldita doença que tudo mina, corrói e destrói, até não restar nada... 

A razão pela qual pedia agora insistentemente, tem a ver com o facto de após ter perdido ambos os pais para a doença, ter durante anos adoptado uma atitude um tanto arrogante perante a morte, como se fosse demasiado azar para uma pessoa só (já que a probabilidade dum relâmpago atingir o mesmo sítio mais que uma vez é altamente improvável...). Além do mais, várias vezes me disseram "podes ter sorte, e a doença saltar uma geração"...

Agora que o meu filho dormia ali na cama de grades pacificamente, achei-me estupidamente arrogante e além do mais, simplesmente parva por acreditar no saltar de geração da genética cancerosa. 
Percebi o tamanho da minha estupidez, pois jamais desejaria conhecer a dor de perder um filho, fosse para o cancro ou outra doença qualquer, ou qualquer outro acontecimento que pudesse arrancar dos meus braços de mãe aquele ser inocente, lindo e puro que conquistou o meu coração na primeira vez que ouvi o seu coração batendo a "galope" dentro do meu ventre!

Nesses momentos e ainda hoje, pedi que se o cancro tiver que aparecer novamente na minha família lagarto, lagarto, lagarto, que acerte em mim e nunca no meu filho! Já conheço a dor de perder os meus ascendentes, não quero jamais conhecer a dor de perder os meus descendentes! 
Porque às primeiras perdas sobrevivi... a custo! 
À perda dum filho sucumbiria certamente! Como diz a Gralha, vergaria! Até ficar prostrada e sem qualquer réstia de vontade de viver.

Por isso, não começo a compreender a dor que os pais e toda a família da Cecília devem estar a passar neste momento... ficando apenas o fraco consolo de saber que ela não sofre mais...

6 comentários:

Melissa disse...

A razão pela qual pedia agora insistentemente, tem a ver com o facto de após ter perdido ambos os pais para a doença, ter durante anos adoptado uma atitude um tanto arrogante perante a morte, como se fosse demasiado azar para uma pessoa só

- TOUCHÉ. Sempre que penso na merda do cancro, penso sempre: caramba, ainda estou "no prazo", ainda é muito cedo para voltar a acontecer,um raio não cai duas vezes na mesma casa. E cai, não é?
Uma merda.

Joana disse...

Naná, fiquei muito comovida com esta notícia. É triste perder as pessoas que amamos para esta terrível doença, perder um filho, deve ser uma dor inconsolável. Muita força para a família da menina e para todos os pais que sofrem esta angústia. Beijinho

dona da mota disse...

O Maior de todos os Medos, não é?!... Uma tristeza sem tamanho...
:(

Naná disse...

Melissinha, é uma valente merda, mesmo!

Joana, nem nunca quero conhecer tal dor!

Maria Vitória, o maior medo mesmo!

martinha martins disse...

Parece que a vida toda corri com muita força, julgando logo desde muito nova o cancro. Amigos na adolescência... amigos na idade adulta, amigos dos pais, e os pais. Mandei o cancro à merda e fiz-lhe frente a promover conforto, mas ver a mim mãe definhar lentamente com o cancro, pensei que depois desta, nem eu sei se serei capaz de ter metade da força de todos, TODOS aqueles que passaram por mim, e foram muitos mesmo, centenas de pessoas que morreram, grande parte de cancro. Ele não é uma merda, é muito mais e vale sempre a pena a luta e a esperança, pois essa, é a última que morre. bjs e saudades

Naná disse...

Martinha, claro que vale a pena lutar! A minha mãe deixou-me esse exemplo, lutando até ao fim! :)